PARTE
I
São fatos ocorridos por volta dos anos de
1959...60 e pouco mais...
O causo relatado aconteceu na época em
que o padre dionisiano havia feito algumas pesquisas e avaliações técnicas que
definiram pela demolição de nossa antiga matriz. Mais uma reforma não valeria a
pena; era a hora de construir uma nova matriz. E assim se fez. Derrubaram a
antiga matriz, e, no local foi iniciada a construção da nossa atual Igreja,
muito mais moderna e principalmente resistente ao tempo, porque a anterior
estava infestada por cupins em suas estruturas de madeiras.
Era um período de tempo em que o distrito
de Santana do Alfié, não contava com um padre fixo para as missas dominicais, casamentos,
batizados, etc. O bispo de Mariana, havia determinado que o padre de Dionísio,
José Índio do Brasil ficasse incumbido de cumprir estas missões. E assim,
mensalmente a missa e os demais sacramentos eram ofertados à todos os valentes
fieis habitantes de Santana do Alfié pelo pároco de Dionísio.
Para superar as dificuldades das estradas
de chão daquele tempo, o nosso Padre contava com um Jeep Willys, pertencente à
Paroquia de Dionísio, e nele eram feitas as viagens ao Alfié. O nosso Padre que
também era muito sociável sempre levava algumas pessoas para lhe fazer
companhia e animar a viagem, sendo que o Sr. Alvim Victorino e o Sr. José Irra
eram dos mais frequentes pois conheciam praticamente todos os habitantes de
Santana do Alfié. José Irra, que tinha a alcunha de Mané Gato era filho daquela
terra (Alfié) e Alvim Victorino era casado com uma filha do Alfié que se tornou
uma pessoa destacadíssima em Dionísio, a Professora Carlota de Vasconcelos, a
nossa querida D. Lotinha.
Francisco Sá |
Como eu estudava em Mariana e sabia
ajudar na celebração da missa, de vez em quando era convidado pelo Pe. José
Índio para ir também.
Em uma destas santas viagens, lá estava
eu, juntamente com o Mané Gato, o Sr. Alvim e lógico, o protagonista principal,
o Padre José Índio, para cumprir com a programação de uma missa e também alguns
batizados no glorioso Distrito de Santana do Alfié.
Cumpridos os compromissos oficiais
chegava a hora dos congraçamentos, que eram certamente as melhores atividades
das inesquecíveis viagens a aquele tão querido distrito pratiano. E vamos às
comemorações (ou bebemorações?)
Alvim Victorino Dias |
Pe José Índio do Brasil |
Como de costume, o Padre e a comitiva
eram convidados para as ceias dos batizados e ou casamentos e foi durante uma
destas comemorações, que o Mané Gato, muito alegre e brincalhão, já meio sem
controle pelo resultado das muitas “branquinhas” deliciosamente degustadas,
comentou com os meus parentes (da família Sá), que os Dionisianos estavam
construindo uma nova igreja, e que o Nonô de Sá (que também foi nascido no
Alfié), estava já arrumando um caminhão para buscar o antiquíssimo sino da
Igreja Matriz do Alfié para a nova Igreja Matriz de Dionísio.
Aqui é bom destacar que o sino da Igreja
Matriz do Alfié foi fabricado em 1724 e naturalmente é uma relíquia de grande
valor histórico para todas pessoas vinculadas a aquela terra.
José Irra |
Zé Irra se apresentava entusiasmadíssimo
com a hipótese de levar tão preciosa peça para ser colocada na nossa nova
Igreja, justificando com os argumentos que os nossos sinos eram pequenos e um
deles estava com uma pequena trinca!
Certamente que as “branquinhas” fizeram
com o nosso Zé Irra esquecesse o valor daqueles sinos para o povo do Alfié, em
especial para os fiéis que nasceram ao som daqueles sinos, que também soaram
nos funerais de seus ancestrais e de seus amigos, sinos que testemunham e
participam da vida de todos habitantes do Alfié a mais de duzentos anos. Os
sinos que marcavam as horas das missas, que informavam aos moradores as horas
do dia. Nem de brincadeira esta blasfêmia deveria ser pronunciada.
Mas, ali, em meio a tantos motivos de
comemorações, salgados, bebidas e etc., ninguém ligou muito para o assunto, e
sempre apoiado pelo sr. Alvim e também pelo Padre, a conversa correu
alegremente na maior cordialidade, sem maiores consequências.
Empanturrados e satisfeitos, tomamos o
caminho de volta com incessante saculejo do Jeep do padre.
Sempre chegávamos muito tarde da noite
nestes domingos especiais que vivíamos estes eventos religiosos e festivos em
Santana do Alfié. Voltávamos todos muito satisfeitos com as rezas e em especial
as confraternizações farturosas e fraternais.
Mais uma missão cumprida e nada mais justo que
uma boa dormida dando um tempo para normalizar o teor alcoólico.
***************
Passados alguns dias, chega a notícia lá
em casa: o pessoal do Alfié, convocados pelos Sr. Santos e incluindo meus
parentes, estavam em pé de guerra, com todos os Dionisianos, e era bom ninguém
ir a Alfié, especialmente o meu pai Nonô de Sá. Alguns haviam levado as
brincadeiras do Zé Irra a sério...
Nonô de Sá |
Os valentes fieis do Alfié mandaram
informar que os sinos centenários jamais sairiam de lá, por nenhum motivo, por
dinheiro algum, e ái daquele que se atrever ir retirar os
sinos de lá. Que para eles era questão de honra, de vida ou morte, e etc.,
etc., etc.
O recado era claro e ameaçador: “Coitado
daquele que aparecesse por lá... “
O único Dionisiano que ainda poderia ir
ao Alfié era o padre para celebrar as missas, batizados e casamentos, mas, que
ele fosse sozinho. Estava declarada a guerra aos Dionisianos!
**************
Meu pai adorou a brincadeira e sempre que
tinha um portador mandava o recado para o pessoal do Alfié: “Assim que arrumar
uma condução vou buscar os sinos da Matriz para Dionísio”.
Foram necessários meses para que a
brincadeira fosse entendida como tal, para que o estado de beligerância fosse
desarticulado e a paz voltasse a reinar entre os bons amigos e parentes do
Alfié e do Dionísio.
É óbvio que algumas coisas foram
complementares ao causo, uns enfeites e exageros, porque com o tempo isto virou
piada, mas que houve mesmo certa PENDENGA entre ALFIE X DIONISIO naquela época,
houve sim. Os mais velhos sabem que
houve...
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PARTE
II - A COMPRA DOS SINOS DA IGREJA MATRIZ DE DIONÍSIO
Em Dionísio, havia um enfermeiro de nome
Pimpão, que trabalhava nas matas do Mumbaça, combatendo a febre malária. Ele
era funcionário da Belgo Mineira e também era da família Sá. Era uma espécie de
“pombo correio”, pois Ia sempre visitar os parentes dele lá no Alfié, e trazia
as novas notícias sobre as polêmicas geradas pela ideia, digamos, da
transferência do sino para Dionísio.
Em uma destas viagens, que fazia a cavalo
e até mesmo a pé, ele foi porta voz da Vovó Olinta, mãe de meu pai, que estava
injuriada com a notícia do "roubo do sino" e prometia fazer e
acontecer com meu pai se ele fosse lá em Alfié para buscar o famoso sino.
Com medo de uma “praga de mãe”, meu pai
tratou logo de ir visita-la e acalma-la e neste contexto é que ele prometeu
para sua mãe que iria adquirir um novo sino para a nossa matriz e encerrar este
assunto de levar o sino do Alfié para Dionísio. E assim foi feita a promessa de
meu pai para minha Vó Olinta!
Meu pai era muito festeiro, muito
conhecido por todos em Dionísio, pois sempre estava frente das festas de São
Sebastião (dentre outras) e usando esta experiência de festeiro, convoca a
comunidade dionisiana para fazer doações para a compra dos novos sinos.
Nonô de Sá, para cumprir a promessa feita
para a Vó Olinta, fez uma viagem a São Paulo para realizar a compra dos sinos,
e se depara com um grande problema: o preço era muito acima do que foi previsto
e arrecadado. Como voltar a Dionísio sem ter comprado o sino? Como encarar a
Mamãe Olinta? Quanta decepção e problemas se voltar sem os sinos comprados...
Pensou, pensou e em virtude da promessa
feita à minha Vó, decidiu que, pagaria a grande diferença que faltava para
completar o valor dos sinos. Só assim o negócio ficaria fechado, pois o pessoal
da fundição não abria mão de receber o valor adiantado.
Feito o pagamento, prometeram também
entregar rapidamente os novos sinos para Dionísio.
Com pouco tempo, chegou o telegrama,
avisando que o sino estava pronto.
Geraldo Coura |
Meu pai, então solicitou do Sr. Geraldo Coura,
um caminhão para buscar o tão almejado sino e assim partiram para São Paulo:
Geraldo Coura, Nonô de Sá, Zé Marques de Oliveira, mais o motorista.
Naturalmente que alguém ia revezando na carroceira, pois, naquele tempo não era
proibido.
Geraldo Coura foi um respeitável
empresário, no transporte de madeira, da mata do Mumbaça até João Monlevade e
também foi vereador da cidade.
Foi uma festa, a chegada do sino!
Foguetes esperavam a caravana e os dionisianos curiosos queriam ver de pertos
os novos sinos da Matriz que cumpririam a partir de então tão importantes
papeis nas comunidades do interioranas como de Dionísio.
Mas, em meio a tanta empolgação, a
preocupação maior de meu pai, era mandar avisar imediatamente ao pessoal do
Alfié, que os nossos sinos chegaram, que eram muito melhores que os deles. O
som era muito melhor!
Inicialmente os sinos ficaram
instalados provisoriamente em uma grande trave de madeira, pois não havia como subir com eles até a
torre. Neste lugar eles ficaram por muito tempo, até que um dia meu pai então
solicitou de seu genro Dicão a utilização de equipamentos da Belgo Mineira para
colocar os sinos na torre da Igreja. Dicão prontificou-se, e com um grande tifor da C.S.B.M., finalmente colocou os sinos
lá no alto, onde se encontram até hoje.
DESTAQUE.
É importante destacar que na ocasião da
fundição dos sinos, o Padre José Índio para homenagear o Sr. Nonô de Sá, que
muito havia contribuído para a aquisição dos sinos, solicitou que fossem
gravados os nomes de Norberto de Sá e José Marques de Oliveira, designados como
padrinhos dos novos sinos.
Nonô de Sá |
José Marques |
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PARTE
III – CONFERINDO A PENDENGA
O
caso não pode terminar ,sem vc. colocar o que vivenciei ,lá no ALFIE. Vamos
lá...
Fui
verificar in loco os sinos causadores da PENDENGA.
Achei
tudo fechado...a vila toda dormindo... Eram 9 horas...Que decepção!
Eis
que aparece uma alma viva, com uma
conversa muito fria, sem nenhum interesse!
Falei
que era da família Sá e que estava a procura de algum parente, no que fui
respondido: Iiiiiiiiiiii
Aquele pessoal não existe mais....Sumiu todo mundo.
Tá
bom , respondi.
Insisti
em fotografar a Igreja por fora, pois o cadeado estava trancado...
Neste
interim ,apareceu uma pessoa, e perguntei como poderia ver a igreja por dentro.
Ele
me indicou com o dedo , onde morava a zeladora da igreja.
Fui
até a casa da zeladora, onde fui atendido e expliquei o motivo de minha visita
ao Alfié.
Ela
se dispôs a ir até a igreja comigo e chamou o Irmão.
Eu
lhe disse que meus pais eram do Alfié.. e citei o nome de minha vovó Olinta.
Mas o
Sr. não é filho do Nonô de Sá, é?
Sim,
respondi, sou filho de Nonô de Sá.
Pois
então nós somos primos, disse ele.
Aí,
me senti em casa... Senti que a minha missão seria cumprida.
Perguntei
se eles sabiam da pendenga dos sinos.
Claro
que sabemos, responderam.
Eu
mesmo fiquei de sobreaviso naquela época, vigiando os sinos.
Então
ele me contou o seguinte:
Ha
mais ou menos 3 anos chegou um congado de barão de cocais para abrilhantar a
nossa festa. O chefe da delegação foi visitar a igreja e foi levado para ver o
sino.
Sabe
o que ele disse? Seus
sinos são falsificados pois os legítimos estão em Dionísio.
No
que ele respondeu: Coitado.. Ninguém nunca teve coragem de vir aqui buscar
estes sinos! E se viesse, não levaria mesmo!
Os
zeladores da igreja são irmãos e se chamam Maria Isabel, atualmente com 75 anos
e Jose Geraldo com 80 anos. Constatamos então que, o pessoal de Barão de Cocais
sabia da história do sequestro do sino.
Assim
que cheguei de frente dos sinos.. Eu disse para o de Geraldo:
O
nosso sino e mais bonito. Acho melhor a gente trocar, vocês ficarão em
vantagem...
Não
vai dar não.. Respondeu ele sorrindo.
E assim chegamos à conclusão que os famosos sinos do Alfié estarão lá para sempre!
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ABUNDA PITA
Em uma das viagens ao Alfié gravei em
minha memória, que por enquanto é muito boa, o seguinte diálogo entre o SR.
Alvim e o Padre José Índio.
O silêncio reinava enquanto o Jeep nos conduzia com
os solavancos sempre, quando de repente o Padre que estava no volante, olhando
para o Morro, disse: É impressionante como tem pés de pita aqui na região!
Imediatamente foi aparteado pelo Sr. Alvim: é.... aqui abunda pita...
Foi
uma risada geral... imaginem as alturas das risadas, onde estavam Zé Irra,
Padre Zé Índio e Sr. Alvim... Só
está figura que vos relata o fato é que não entendeu nada na hora.
Somente
depois é que me dei por entendido.
PS: A pita era muito usada pelos barbeiros de
Dionísio para afiar as navalhas. Recordando em especial o Mudo e o Zé Condessa
que cortaram tantos cabelos dos dionisianos.
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Gostei da história do sino.
ResponderExcluirMeu pai, Claudino, nascido em Alfié não nos revelou essa história, talvez tivesse receio de perder o precioso sino.
Olá conterrâneo. Gostei do seu blog. Já compartilhei algumas de suas fotos em meu blog.
ResponderExcluir"Quem não conhece a sua História, está sujeito a repeti-la!"
Vamos conhecer a nossa!
Sou lá de Laranjeira e da Serra. Neto de Piruca!
Por favor, me passe o link de seu blog. Quero conhecê-lo. Abraços.
ExcluirAdorei conhecer essa história..
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